Experiências apontam que essa pode ser a chamada 'partícula de Deus'. Novas pesquisas são necessárias para afirmar que este é o bóson de Higgs.
Cientistas anunciaram nesta quarta-feira (4) a observação de uma partícula subatômica inédita até então. Eles veem fortes indícios de que se trate do “bóson de Higgs”, a “partícula de Deus”, única partícula prevista pela teoria vigente da física que ainda não tinha sido detectada em laboratórios, e que vinha sendo perseguida ao longo das últimas décadas.
Pela teoria, o bóson de Higgs teria dado origem à massa de todas as
outras partículas. Se sua existência for confirmada, portanto, é um
passo importante da ciência na compreensão da origem do Universo. Se ele
não existisse, a teoria vigente deixaria de fazer sentido, e seria
preciso elaborar novos modelos para substituí-la.
“Eu não tenho muita dúvida de que, na física de partículas, é o evento
mais importante dos últimos 30 anos”, afirmou Sérgio Novaes, pesquisador
da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), que faz parte da
colaboração CMS. "Eu acho que é um momento histórico que a gente está
vivendo", completou.
Apesar do grande impacto na física teórica, a descoberta ainda não
representa um avanço direcionado a nenhum campo específico da
tecnologia.
O “bóson de Higgs” ganhou o apelido de “partícula de Deus” em 1993,
depois que o físico Leon Lederman, ganhador do Nobel de 1988, publicou o
livro “The God Particle” (literalmente “a partícula de Deus”, em
inglês), voltado a explicar toda a teoria em volta do bóson de Higgs
para o público leigo. Ainda não há edição desse livro em português.
A nova partícula tem características “consistentes” com o bóson de
Higgs, mas os físicos ainda não afirmam com certeza que se trate da
“partícula de Deus”. Para isso, eles vão coletar novos dados para
observar se a partícula se comporta com as características esperadas do
bóson de Higgs.
O anúncio foi feito em Genebra, na Suíça, sede do Centro Europeu de
Pesquisas Nucleares (Cern, na sigla em francês). As conclusões foram
baseadas em dados obtidos no Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em
inglês), acelerador de partículas construído pelo Cern ao longo de 27
quilômetros debaixo da terra, na fronteira entre a França e a Suíça.
Essa máquina, considerada a mais poderosa do mundo, foi construída
especificamente para estudos de física de partículas, e a descoberta
desta quarta é a mais importante que já foi feita lá até o momento.
A descoberta foi confirmada por especialistas do CMS e do Atlas, dois
grupos de pesquisa independentes que fazem uso do LHC. Apesar de usarem o
mesmo acelerador de partículas, as duas colaborações científicas
trabalham com detectores diferentes e seus resultados são paralelos. Os
resultados antecipados hoje ainda serão publicados em revistas
científicas.
Os cientistas medem a massa das partículas como se fosse energia. Isso
porque toda massa tem uma equivalência em energia. Se você calcula uma,
tem o valor das duas. A unidade de medida usada é o gigaelétron-volt, ou
"GeV".
No anúncio, o CMS disse que observou um “novo bóson com a massa de
125,3 GeV” – com margem de erro de 0,6 GeV para mais ou para menos – “em
4,9 sigmas de significância”. Esses “sigmas” medem a probabilidade dos
resultados obtidos. O valor de 4,9 sigmas representa uma chance menor
que um em 1 milhão de que os resultados sejam mera coincidência. Por
isso, os cientistas consideram esse número como uma confirmação da
descoberta.
Paralelamente, o grupo Atlas afirmou que “exclui a não-existência de
uma partícula com a massa de 126,5 GeV, com a probabilidade de 5
sigmas”. A pequena diferença entre os números dos dois grupos -- de
125,3 GeV para 126,5 GeV -- não é considerada significativa pelos
físicos.
Em 2011, pesquisadores dos dois grupos de pesquisa do Cern já haviam
“encurralado” o bóson de Higgs, quando identificaram a faixa em que
encontrariam a partícula – a massa estaria entre 115 GeV e 130 GeV.
Na última segunda, pesquisadores norte-americanos também tinham encontrado “forte evidência” da existência da partícula, em experiências com um acelerador próprio, o Tevatron.
Ilustração de uma colisão entre partículas promovida pelo
acelerador LHC. É com experimentos como esse que os cientistas estudam
partículas como o bóson de Higgs (Foto: Cern)
Um dos motivos pelos quais é tão difícil detectar o bóson de Higgs é a
sua instabilidade. Essa partícula dura muito pouco tempo e rapidamente
se transforma – decai, no jargão científico – em outras. Para encontrar a
nova partícula anunciada nesta quarta, eles estudaram o resultado
destes decaimentos.
anto o CMS quanto Atlas concentraram seus esforços em duas partículas
específicas: os fótons, que é como a luz se manifesta, e os bósons Z,
que medeiam a chamada força fraca. O resultado foi suficiente para
identificar a existência de uma partícula inédita, mas não para
caracterizá-la em detalhes.
Para confirmar se o bóson descoberto é mesmo a “partícula de Deus”,
será necessário estudar a fundo os decaimentos. O Modelo Padrão –
conjunto de teorias mais aceito para explicar as interações da natureza e
as partículas fundamentais que constituem a matéria – prevê o
decaimento do bóson de Higgs em diferentes partículas, cada uma em
determinada quantidade.
O próximo passo dos cientistas é testar os vários decaimentos
decorrentes dessa partícula. Se os resultados continuarem sendo
coerentes com o Modelo Padrão, será confirmado que ela é mesmo o bóson
de Higgs.
Caso haja divergências, pode ser que explicações teóricas alternativas
sejam adotadas. Já existe uma, chamada de supersimetria, que faz adendos
ao Modelo Padrão e prevê a existência de vários bósons de Higgs com
pequenas divergências entre si. Enquanto estas experiências não
mostrarem resultados, é impossível afirmar qual dos modelos se adéqua
melhor à natureza.
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Estava todo mundo empolgado", relatou Denis Oliveira Damazio, contratado
pelo Laboratório Nacional de Brookhaven, nos Estados Unidos, que
trabalha na sede do centro suíço.
Representação gráfica de colisão de prótons realizada no LHC (Foto: Fabrice Coffrini/AFP)
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